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segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

VOU INVESTIR EM UMA EMPRESA DE MARKETING


  A tradicional doceira virou “cake designer”. É chic, mais o produto é o mesmo.
A caminho de meus sessenta anos decidi enveredar por outra atividade profissional. Alguns hão de me perguntar o que me levou a tomar essa decisão, respondo de pronto: foi as várias formas de marketing usados pelas indústrias e comércio para vender aos incautos clientes fazendo o sujeito acreditar que precisa adquirir um produto que, via de regra, não precisa; é a velha mutreta do capitalismo de empurrar de goela abaixo o que a gente não precisa. Aí o sujeito acaba se sentindo importante, pois comprou um produto que acredita ser top de linha.
Falando em ostentação lembrei-me de um colega de trabalho que passou vários meses paquerando uma amiga lhe fazendo vários convites para jantarem em um restaurante chic instalado em um dos shoppings mais modernos de Manaus. Após resistir algum tempo o convite do dom Juan, enfim foi aceito, ele persuadiu a moça a acompanhá-lo no jantar. Ao chegar ao restaurante, faceiro e garboso, meu colega pediu o cardápio e, de imediato, para impressionar a sua amada, sugeriu o prato “Califórnia Sunset”. A jovem ficou impressionada com o conhecimento gastronômico de meu amigo, pois a mesma não conhecia o menu.
Após esperarem alguns minutos, entre um drink e outro, lá vem o garçom trazendo o jantar que para o espanto da então quase namorada de meu amigo, nada mais era que um filé de frango com batatas fritas, farofa e arroz branco, enfeitado com algumas ervas. Sem se fazer de rogada a jovem jantou, mas tomou um susto quando o garçom trouxe o valor da despesa. Ao saírem do restaurante a agora namorada decidiu fazer uma gracinha com seu amado e lascou: ”o jantar estava bom mais a mamãe prepara esse filé de frango do mesmo jeitinho por menos da metade do preço”.
Lembro de 1981 quando do aniversário de três anos de meu filho Anderson, pensei em comemorar, convidei parentes e amigos para, no domingo seguinte, estarem em minha casa para cantar os parabéns. Naquela época não tive dificuldades em encomendar à dona Deusa, moradora do bairro, bolo e salgadinhos, naquele local  haviam várias doceiras, logo meu problema com relação às guloseimas estava solucionado.
Na semana passada minha filha adotiva Jamile completou seis anos, então decidi comemorar seu aniversário, passei então a procurar no bairro de Santo Antonio, onde moro, uma doceira que pudesse preparar doces e salgadinhos apara o evento, mas logo notei que não teria sucesso, pois hoje a figura da doceira não mais existe no bairro. É mais fácil encontrar naquele local um torcedor do América Futebol Clube que alguém que tenha essa profissão.
Caminhava para uma padaria do bairro para fazer a encomenda do material que seria usado no aniversário, quando encontrei uma colega de trabalho que me indicou uma “cake designer” que mora no bairro. Sem entender bem o que faz essa profissional perguntei à minha amiga, que deu uma sonora gargalhada, explicando em seguida que é assim que se chamam as doceiras e quituteiras de hoje. Caminhei para o local onde a tal senhora atende e me surpreendi com o orçamento que me foi dado. Ela faz o bolo de antigamente, brigadeiros, salgadinhos e a única diferença é o nome dos produtos produzidos por essa senhora: são todos traduzidos para o inglês, talvez isso lhe dê o direito de cobrar dos incautos um valor exorbitante.
Após receber o orçamento bati em retirada pensativo como é que uma comida simples passa a custar uma fortuna, talvez porque alguém cheio de criatividade decidiu colocar um nome fresco para cobrar mais caro.
Tenho um amigo dono de uma floricultura que chama as floristas que trabalham com ele de “flower disgner”; e a dona do salão onde corto mensalmente meu cabelo chama as manicures de “personal nail caretaker”.
Conversando com meu amigo Alexandre Oto, sugeri que mudássemos de profissão enveredando pela “Consultoria Social” e a nossa nova função será a de vender qualquer coisa. Para isso iremos usar nomes criativos, preferencialmente em inglês. Para os problemas que nos forem trazidos pelos clientes usaremos idéias mirabolantes para solucionar.
Nosso ‘escritório’ - esse é o nome que se usava no passado - chamaremos de “birô de soluções imediatas”. Vamos lançar no mercado local, inicialmente um trabalho em crochê que é produzido por minha mulher que o utiliza como enfeite para geladeira e fogão. Estou pensando no nome que vou usar, tenho certeza que sempre aparecerá alguém com grana disposto a pagar um bom dinheiro por um produto que aparentemente serve para alguma coisa.
Nas próximas eleições irei sugerir ao político que trabalho para contratar umas meninas bonitas, que usam aquelas roupas em lycra que as chamarei de ‘promotora de marketing direto’, que nada mais é que aquelas meninas que entregam panfleto nos sinais.  
É por tudo isso que vou mudar de atividade vendendo produtos e serviços, trocando alguns nomes do nosso bom português para o inglês. É uma questão de sobrevivência e criatividade, além de ser chique, aliás, chic.
Por: Paulo Onofre
Jornalista (MTb 467)
Jornal Tribuna do Iranduba